Feijão maravilha: como o ingrediente que está no prato do dia a dia pode ajudar sua saúde

05th Fevereiro 2014

Um dos grandes trunfos do feijão frente ao câncer está aparentemente no fato de ele apresentar baixo índice glicêmico. Isso significa que o alimento faz a liberação da glicose para o sangue ocorrer em ritmo de tartaruga. Dessa forma, não há necessidade de uma enxurrada de insulina entrar em campo para jogar o açúcar dentro das células. Ainda bem. Segundo Henry Thompson, diretor do Laboratório de Prevenção do Câncer da Universidade do Estado do Colorado, há evidências de que o excesso desse hormônio correndo na circulação está intimamente associado ao desenvolvimento de tumores. 

 

Para Thompson, o assunto feijão rende muito mais caldo. Em uma investigação com cobaias, o cientista percebeu que o consumo da leguminosa reduziu a incidência de câncer de mama em 70%. Tudo indica que ela regula mecanismos normalmente desajustados em quem tem propensão a tumores mamários, explica. Agora, sua meta é justamente analisar a fundo todas as propriedades do alimento. Para isso, ele e outro colega da universidade acabam de receber um incentivo de 1,5 milhão de dólares do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos - o que reforça a expectativa em torno do tema. Enquanto a equipe prepara o laboratório, Thompson adianta: Com base nos dados atuais, julgamos que os efeitos protetores são resultado do consumo do grão inteiro devidamente cozido, e não de uma molécula isolada.

De fato, o ingrediente que já foi o queridinho dos brasileiros concentra uma gama de substâncias do bem. As leguminosas fornecem proteínas que, entre outras funções, ajudam a formar peptídeos bioativos, exemplifica a nutricionista Hercia Martino, da Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais. Esses peptídeos têm ação antioxidante e diminuem o risco de trombose, hipertensão e até mesmo câncer, revela.

O feijão ainda oferta polifenóis, moléculas que também têm a capacidade de dar um chega pra lá nos radicais livres. Eles causam danos celulares que contribuem para o surgimento de tumores. Daí a importância de garantir os antioxidantes na alimentação, aponta a nutricionista Neuza Maria Brunoro Costa, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

Outras substâncias que se destacam na leguminosa são as fibras - encontramos 8,5 gramas delas em 100 gramas de feijão- carioca cozido. Grande parte de sua fama se deve ao potencial de botar o trânsito intestinal atravancado para andar, estímulo que faz mais do que aumentar o número de visitas ao banheiro. \\\\\\\"As fibras auxiliam na prevenção do câncer no intestino\\\\\\\", observa a nutricionista Solange Brazaca, professora da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo, em Piracicaba, no interior paulista.

Freio no açúcar

É por causa da quantidade elevada de fibras e carboidratos complexos, inclusive, que o feijão apresenta aquele índice glicêmico baixinho, baixinho. Se é cedo para cravar que essa característica está 100% vinculada à ação anticâncer, pelo menos tem um impacto incontestável: ela dá uma força e tanto no enfrentamento do diabete.

Quem precisa controlar rigidamente as taxas de glicose tem muito a ganhar com algumas conchas de feijão, aponta uma pesquisa da Universidade de Toronto, no Canadá. Os cientistas notaram que os portadores de diabete que investiram nele e em outras leguminosas, tais como ervilha e lentilha, também tinham o colesterol mais controlado do que aqueles que apostaram as fichas só em pães e arroz integrais. É que, apesar de esses itens terem fibras, o índice glicêmico do feijão e companhia ainda é mais baixo.

Para a nutricionista Anita Sachs, da Sociedade Brasileira de Diabetes, a conclusão dos canadenses - de que algumas colheradas do grão seriam ainda mais vantajosas para os diabéticos - é legítima. Até porque no Brasil os pães integrais não têm quantidade tão elevada de fibras. Sem contar que há adição de gorduras para dar consistência e sabor ao produto. O feijão, por outro lado, pode ser preparado sem gordura, justifica a especialista.

Já na disputa com alimentos abarrotados de carboidratos simples, daqueles que disparam a glicose no sangue rapidinho, não há conversa: o feijão ganha de lavada. Em investigação da Universidade de Ciência e Saúde de Oregon, nos Estados Unidos, uma equipe avaliou as flutuações glicêmicas de adultos com diabete do tipo 2 depois de comerem apenas arroz - representante dessa turma apressadinha - ou arroz com feijão. Os exames mostraram, então, que as taxas de glicose na circulação eram significativamente mais baixas quando a refeição continha a combinação clássica. A proporção ideal é de 2 colheres de arroz para 1 concha apenas de feijão cozido, aconselha a nutricionista Eliana Cristina de Almeida, da Universidade Federal de São Paulo. Se o espaço reservado ao cereal for maior do que esse, o índice glicêmico sobe. Daí o feijão pode não dar conta de derrubá-lo, avisa.

O grão consumido de norte a sul no país também labuta pela perda de peso - algo essencial tanto para manter o diabete sob controle como evitar outros problemões, a exemplo de doenças cardiovasculares e dores nas articulações. Rico em fibras, o feijão aumenta a sensação de saciedade após as refeições, explica Patricia Cruz, nutricionista da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica. Por isso devemos caprichar no consumo, até porque dá para alternar as variedades e as formas de preparo, sugere.

O feijão-carioca é, de longe, o preferido dos brasileiros - representa 42% das variedades produzidas aqui. E, apesar de não haver diferenças tão relevantes entre a sua composição nutricional e a dos outros tipos (você conhece alguns deles no quadro da página 34), revezá-los na panela tem tudo para trazer benefícios. O feijão-caupi, ou feijão-fradinho, por exemplo, é um ótimo candidato à mesa. Muito consumido no Nordeste, ele se mostrou uma arma eficientíssima para baixar os níves de colesterol. Quem assina a descoberta é a nutricionista Karoline Frota, da Universidade Federal do Piauí. Em seu doutorado, realizado pela Universidade de São Paulo (USP), 38 pessoas com colesterol alto receberam um shake preparado com vicilina, a proteína isolada do feijão nordestino, por seis semanas. Ao examiná-los, a pesquisadora viu que o colesterol total caiu 32 mg/dl. Por sua vez, o colesterol LDL, considerado ruim, despencou 33 mg/dl - estudos recentes mostram que uma redução de 40 mg/dl é o suficiente para derrubar o risco de um evento cardiovascular em 22%. Ao focar nas taxas de HDL, o colesterol amigo das artérias, Karoline também teve boas surpresas. \\\\\\\"Observei um aumento de 1,2 mg/dl.\\\\\\\" Parece pouco, mas há indícios de que a elevação de 1 mg/dl representa uma queda de 2% na probabilidade de piripaques cardíacos.

Uma das hipóteses para explicar o feito é que os peptídeos bioativos impedem a fabricação do colesterol no fígado. Há também a possibilidade de a vicilina estimular a maior excreção de ácidos biliares. Quando isso ocorre, há necessidade de recrutar colesterol do sangue para formar mais desse ácido, raciocina a especialista. Por isso, uma parte dele some de circulação. Deve-se salientar que, para aproveitar a mesma quantidade de proteína utilizada na pesquisa, seria preciso devorar pelo menos 6 conchas de feijão-fradinho por dia. Mas com 2 conchas diárias e uma vida equilibrada é possível que o impacto já seja razoável, acredita Karoline.

Outros projetos demonstram que o feijão-fradinho não é o único a dar uma rasteira no colesterol. Em seus estudos, a nutricionista Neuza Maria Brunoro Costa, da Ufes, avaliou diferentes variedades do grão e chegou à conclusão de que basta ter cor - preto ou marrom - para combater a molécula gordurosa. \\\\\\\"O efeito provavelmente tem relação com a presença de compostos fenólicos, substâncias antioxidantes que dão o tom à casca. Tanto é que o feijão-branco não mostrou essa propriedade\\\\\\\", revela. As fibras participam da empreitada, já que no intestino formam um gel capaz de sequestrar o colesterol e mandá-lo para fora do organismo.

Para melhorar, o pesquisador Alisson Chiorato, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), no interior paulista, identificou uma boa concentração de isoflavonas no grão - até então, acreditava-se que apenas a soja escondia essas protetoras do peito. Apesar de não ser exorbitante, a quantidade é expressiva. Ainda mais se considerarmos que o brasileiro está habituado a comer feijão, e não soja, analisa. Mas só o hábito não basta. O combo de benefícios depende, sobretudo, da frequência de consumo. Parafraseando Chico novamente, bote água no feijão - e coma todo santo dia.

Fonte MdeMulher